São Paulo, 4 de setembro de 2019.
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5021379-23.2019.4.03.0000
RELATOR: Gab. 21 - DES. FED. JOHONSON DI SALVO
AGRAVANTE: SANTHER FABRICA DE PAPEL SANTA THEREZINHA S/A
Advogado do(a) AGRAVANTE: PAULO GUILHERME DE MENDONCA LOPES - SP98709-A
AGRAVADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
D E C I S ÃO
Agravo de instrumento interposto por SANTHER FÁBRICA DE PAPEL SANTA THEREZINHA S/A em face da decisão que deferiu em parte a medida liminar tão somente para afastar a limitação
introduzida ao art. 74, § 3º, IX, da Lei n.º 9430/2018, garantindo o direito à compensação de débitos de IRPJ e CSLL apurados pela sistemática das estimativas mensais, com créditos originados antes de 30.05.2018,
assegurando à impetrante a regular recepção e processamento da declaração de compensação, o que não poderá ser indeferido pela autoridade impetrada.
Considerou o MM. Juízo de origem que as alterações promovidas na redação do art. 74, da Lei nº 9430/96, inseridas pela Lei nº 13670/2018 não podem afetar os recolhimentos e os créditos de IRPJ e CSLL
apurados pela sistemática das estimativas mensais que foram constituídos antes da data de 30/05/2018, ou seja, antes da entrada em vigor da Lei nº 13670/2018. Entretanto, quanto aos demais créditos gerados após a entrada
em vigor da referida lei, não vislumbrou o alegado periculum in mora a justificar a concessão de liminar, entendendo assim que o pleito poderá ser apreciado no momento da prolação de sentença.
Nas razões recursais a impetrante/agravante sustenta, em síntese, que a opção pela forma de recolhimento do IRPJ e da CSLL é irretratável para todo o ano-calendário, de modo que a alteração legislativa com
vigência imediata resulta em ofensa aos princípios da irretroatividade, da segurança jurídica e do direito adquirido.
Quanto ao perigo de dano, aduz que o reconhecimento contábil do ativo em dezembro de 2018 gerará um incremento na tributação do IRPJ e da CSLL da ordem de R$ 6 milhões, cujo ônus a agravante não
estava preparada para arcar.
Pede a reforma da decisão, com antecipação dos efeitos da tutela recursal, para assegurar à agravante o direito à compensação dos débitos relativos ao recolhimento mensal por estimativa de IRPJ e CSLL para
o ano-calendário de 2018 com créditos seus, sendo afastada a vedação prevista no art. 8º da Lei nº 13.670/18, a aplicação de qualquer penalidade e as glosas de compensações correspondentes.
Decido.
O sujeito passivo que apurar crédito, inclusive os judiciais com trânsito em julgado, relativo a tributo ou contribuição administrado pela Secretaria da Receita Federal, passível de restituição ou de ressarcimento,
poderá utilizá-lo na compensação de débitos próprios relativos a quaisquer tributos e contribuições administrados por aquele Órgão (art. 74 da Lei nº 9.430/96). Além das hipóteses previstas nas leis específicas de cada tributo
ou contribuição, não poderão ser objeto de compensação mediante entrega, pelo sujeito passivo, da declaração referida no § 1º do art. 74 da Lei nº 9.430/96, os débitos relativos ao recolhimento mensal por estimativa do
Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) apurados na forma do art. 2º dessa mesma lei. Essa é a redação dada pelo art. 6º da Lei nº 13.670, de 2018,
ora combatida pela empresa que vinha se valendo da compensação de seus créditos como forma de quitação do IRPJ/CSLL - estimativa.
O principal argumento da ora agravante é no sentido de que a alteração legislativa introduzida pela Lei 13.670/2018 fere o princípio da segurança jurídica.
Num primeiro momento, tal argumento parece prosperar, inclusive por conta de previsão inserta no artigo 6º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro. A opção pelo regime tributário é feita no início
do ano e diante dela a empresa "se programa" em matéria econômica e tributária, sendo lícito o planejamento tributário com vistas a economicidade empresarial. Feita a escolha, ela se torna irretratável, ou seja, a empresa
vincula-se à opção feita ainda que, porventura, ela se torne inconveniente ao longo do período ânuo.
Parece ilógico que, nesse cenário em que uma atitude do contribuinte é tida como válida numa expectativa "sine die", o Poder Público legislador venha a mudar a regra fiscal abruptamente, de modo a quebrar-lhe
o planejamento tributário e empresarial. O princípio da segurança assumiu apreciável vigor no panorama do direito brasileiro, graças à recente alteração da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, eis que no seu art.
30 há um chamado das autoridades públicas "para aumentar a segurança jurídica na aplicação das normas...", sendo certo que a Lei nº 13.670 é posterior a esse comando normativo.
O princípio da segurança assumiu apreciável vigor no panorama do direito brasileiro, graças à recente alteração da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, eis que no seu art. 30 há um chamado das
autoridades públicas "para aumentar a segurança jurídica na aplicação das normas...", sendo certo que a Lei nº 13.670 é posterior a esse comando normativo.
É certo que em matéria de compensação tributária, o entendimento jurisprudencial, inclusive em sede de recurso repetitivo é no seguinte sentido (destaquei):
TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. COMPENSAÇÃO TRIBUTÁRIA. LEI APLICÁVEL. VEDAÇÃO DO ART. 170-A DO CTN. INAPLICABILIDADE A DEMANDA ANTERIOR
À LC 104/2001.
1. A lei que regula a compensação tributária é a vigente à data do encontro de contas entre os recíprocos débito e crédito da Fazenda e do contribuinte. Precedentes.
2. Em se tratando de compensação de crédito objeto de controvérsia judicial, é vedada a sua realização "antes do trânsito em julgado da respectiva decisão judicial", conforme prevê o art. 170-A do
CTN, vedação que, todavia, não se aplica a ações judiciais propostas em data anterior à vigência desse dispositivo, introduzido pela LC 104/2001. Precedentes.
3. Recurso especial provido. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 08/08.
(REsp 1164452/MG, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 25/08/2010, DJe 02/09/2010)
Sucede que no caso "sub judice" existe a questão - séria - da insegurança trazida pela lei nova, sendo notável que o "imperium" do Estado não pode assumir feição absoluta a ponto de inviabilizar a relação de
boa-fé objetiva (art. 187 do Cód. Civil, mas que é norma geral derivada até do bom senso) que deve vicejar entre Estado e contribuinte. A eticidade da legislação é um valor a se perseguir no estado democrático de direito. O
saudoso ministro José Augusto Delgado escreveu que "interpretar as regras do Código Civil com base em princípios éticos é contribuir para que a idéia de justiça aplicada concretamente torne-se realidade" (destaquei); ora, se
isso é correto no direito privado, com muito mais razão há de ocorrer na seara do direito público eis que a preponderância estatal deve guardar limites e e as antigas noções de "fato do príncipe" hoje devem ser vistas "cum
granulum salis".
Não se trata, neste momento e grau de jurisdição, de decretar a inconstitucionalidade da norma, mas sim de conferir-lhe um tratamento ético, que prestigie a boa-fé e a segurança jurídica, de sorte que o novel
regime de compensação, no que tem de restritivo em relação à matéria aqui tratada, respeite o regime eleito pelo contribuinte para o ano de 2018, como lhe era permitido fazer, para, assim, poder operar no âmbito
econômico sem surpresas.
Enfim, não custa aduzir que a segurança jurídica em matéria tributária tem sido prestigiada em julgados do STJ: AgInt no REsp 1619595/SC, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA,
julgado em 16/10/2018, DJe 24/10/2018 - REsp 1669310/RS, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 11/09/2018, DJe 27/09/2018.
Ante o exposto, defiro a antecipação de tutela recursal para assegurar à empresa agravante o regime de compensação reclamado na minuta de agravo de instrumento.
Comunique-se ao MM. Juízo “a quo”.
Após, ao Ministério Público Federal para parecer.
Publique-se e cumpra-se.
São Paulo, 4 de setembro de 2019.
APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº 5001001-63.2017.4.03.6128
RELATOR: Gab. 19 - DES. FED. FÁBIO PRIETO
APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, TYCO ELECTRONICS BRASIL LTDA, AMP DO BRASIL CONECTORES ELÉTRICOS E ELETRÔNICOS, TYCO
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DIÁRIO ELETRÔNICO DA JUSTIÇA FEDERAL DA 3ª REGIÃO
Data de Divulgação: 12/09/2019 686/1437